Race report Serra D'Arga (1ª parte)
Por Luís Moura:
Vou começar o artigo pelo fim. Cheguei a Dem no final dos 53Km cheio de energia mas com o corpo completamente massacrado das violentas subidas e descidas em pedra dura.
A corrida foi muito equilibrada, com muitas zonas técnicas e alguns pontos para correr. Estava muita gente a assistir à chegada dos atletas, mas uma boa parte estava 50 metros ao lado com a entrega de prémios a decorrer. Daqueles que correm a sério na montanha.
Voltando ao início... Ida para Dem.
A viagem de Lisboa para o Porto foi feita ao final de sexta-feira, de modo a poder ter o sábado inteiro para relaxar e preparar mentalmente a prova, sem a habitual correria de chegar 1 hora antes da prova e andar sempre a correr.
Depois de passar o dia de sábado a visitar familiares e passear um pouco por algumas zonas do Porto, foi altura de deitar cedo para me levantar às 4:30 da manhã no domingo.
Para a maior parte dos seres racionais pensantes, levantar a estas horas num domingo é qualquer coisa que não é apreensível e dá origem a alguns termos menos próprios, e se for da zona do Porto, impropérios fortes…
No domingo, levantar e acordar com calma, tomar o pequeno-almoço reforçado, preparar a roupa e sair de casa. Chegada a Dem pouco depois das 6:30, já com o dia a espreitar de soslaio por cima da montanha. Este ano com o acréscimo de participantes, e respetivas viaturas, foi feita uma gestão diferente dos parques automóveis, com as pessoas que chegaram primeiro a ficar num parque improvisado a cerca de 400 metros do centro e os que chegaram mais tarde a passar para o parque dos anos anteriores, provocando aqui uma certa confusão. O parque "antigo" deveria ter sido usado primeiro, já que às 7:30/7:40, já com as pessoas em peso no centro de Dem a preparem-se para correr e ainda muitos carros a passar pelo centro para ir para o parque.
A metodologia de colocar os carros que chegam mais tarde mais perto do centro para não se perder tempo resulta em termos teóricos, mas quando eles tem que passar no centro da vila para ir para lá, mesmo pelo meio das pessoas, deixa de fazer sentido. Um ponto a rever no próximo ano.
Antes da prova
Levantar dorsal e o saquinho de ofertas e levamos com a segunda surpresa. Este ano o chip de controlo era dos quadrados pequenos que normalmente usamos nas provas de estrada nos cordões.
Ainda bem que quase 1/3 das sapatilhas de Trail não tem cordões para os colocar!
Poderiam ter avisado uns dias antes para a malta se precaver. Em cima da hora, num trilho como o que íamos encontrar, não me parece que foi a melhor opção e a maneira como não comunicaram. A meio da prova eu quase não via o chip com tanta lama que ficou por cima dele !!!
Regressar ao carro a pensar como encaixar o chip nas sapatilhas, vestir a roupa para a prova. Com o tempo fantástico que tudo indicava que iria estar, os calções, a t-shirt da crew Correr na Cidade e meias é suficiente... Mochila com 1,2L água, uma barra energética de SOS e o impermeável + telemóvel, os equipamentos obrigatórios para ir à prova. Tudo pronto e seguimos para o ponto de saída.
Chegamos ao local da partida já pouco depois das 07:30 devido ao tempo que se perdeu por causa da distância do estacionamento, foi altura de ser controlado na entrada para o curral de arranque, coisa que nunca tinham feito em Arga desta maneira, mas que deveria ser sempre assim.
Na partida toda a gente estava com um sorriso nervoso, uma ansiedade falante pelos olhos que não deixa ninguém imune. Uns mais que outros, com muito respeito pela montanha que estava à nossa frente. A montanha que não é muito alta em altimetria pura, mas tem imensas subidas difíceis e segredos que só se entendem quando se percorre as suas entranhas e veias. Consegue quebrar a vontade de homens de barba rija.
Prova
Este ano por causa do maior número de participantes no arranque, decidiram fazer uma pequena volta de 1km e pouco à volta da vila de Dem para o grupo esticar um pouco antes de iniciar a primeira subida. Não é das mais difíceis, mas como normalmente entramos ali com o corpo frio, rapidamente se torna uma parede difícil de passar.
Eu e o Stefan Pequito tentamos colocar-nos mais à frente e durante a volta de "aquecimento" subimos bastantes posições, sendo que ele saltou lá para os primeiros 30/40.
E como o coração dispara quando arrancamos para os 4/4:30 ao quilómetro como neste caso! É preciso ter muita elasticidade e encaixar bem estes esticões.
Aproveitei que o grupo ainda estava a aquecer e fui subindo a passar devagarinho outros concorrentes e a tentar não andar no redline. Quando comecei a descer para o primeiro abastecimento, já devia rolar lá para os 60/70 do grupo, mas como saímos ao mesmo tempo que os corredores dos 33, era sempre complicado alinhar com quem estava à nossa frente ou atrás o ritmo, porque andávamos muito tempo ao lado dos que estavam nos 33km, e eles deveriam ao início andar a rolar a ritmo mais elevado.
Chegada ao abastecimento dos 9km que era "opcional". O Sefan já ia bem lançado lá na frente e o Pedro Luiz, o terceiro membro da Crew em Arga (que está ainda a recuperar de uma lesão grande) estava mais para trás. Eu mantive-me ali pela frente e a sentir-me bem. Últimos 4km sempre perto dos 4/km e ainda mais 1km a descer até começar a subir. Feeling good!
Engraçado, como sendo a minha terceira vez nesta prova, tive consciência de muita coisa, a minha performance foi uma delas.
Tal como não paro de dizer nos treinos a quem nos pergunta, o peso nos trilhos é FUNDAMENTAL, é um dos fatores que mais nos provoca flutuações nos andamentos, quer a subir ou a descer. Do primeiro ano para o segundo dei um salto grande em termos técnicos e de ritmo, mas do ano passado para este o grande salto foi mesmo na performance.
O facto de estar com menos 8kg do que no ano passado fez com que as subidas fossem devoradas a ritmo elevado e as descidas muito rápidas. Decidi neste trail fazer como fiz já nos outros 4 trilhos deste ano, um frasco da mochila com apenas 600ml de água apenas e outro com 600ml de agua + 1 pastilha de eletrólitos. Mal eu sabia o que é que esta opção me iria provocar…
Subimos alguns km's numa inclinação não muito pesada mas constante, para depois começarmos a descer para o abastecimento dos 17km, onde aproveitamos para reabastecer de água e comer alguns sólidos.
A famosa aletria feita pela mulher do Carlos Sá apareceu pela primeira vez. Foram cinco minutos por ali e depois arrancar. Notava-se muitos corredores dos 33km à nossa volta e alguns dos 53km.
Nesta altura duvidei se isto seria um bom sinal que ia bem ou se já estavam muitos à minha frente sem me ter apercebido. Ao km 19, pouco depois de sair do abastecimento, veio a grande surpresa nesta altura. Estava com desconforto na barriga há já alguns km's e não consegui conter o trabalho forte, descontrolado e completamente desvairado dos intestinos.
Salvou-me um dos lenços que levei para limpar os óculos, e 8min depois de um contacto mais pessoal com a natureza, foi altura de recuperar o tempo perdido.
Comecei a ir subindo aos poucos, passando alguns elementos dos 33km, subindo pelo meio de pedaços gigantes de granito, misturado com rios pequenos e chatos. Os pés molhados foram uma constante, tal como no ano passado, mas por motivos diferentes.
Pouco depois entramos no percurso já conhecido dos anos anteriores e foi rolar até ao abastecimento dos 25km. Sempre com imensas opções para comer e beber. Se existe uma coisa que não nos podemos queixar aqui, é da prova ser soft e dos abastecimentos, são fantásticos e muito acima do que precisamos para correr.
Ligar telemóvel para dizer à Liliana que já estava nos 25km e para ela se tranquilizar um bocado, já que estava nos 33km à minha espera para me dar apoio. Respondeu que os primeiros dos 53km estavam a passar no abastecimento dos 33km. ok... siga !
(amanhã, 2ªfeira, dia 6 de outubro, publicamos a 2ª parte do relato do Luís Moura)