Race Report: Conquistar Santa Maria no Columbus Trail
Fantástico. Deslumbrante. Um paraíso. Nem tenho palavras para descrever o que senti o fim-de-semana passado. Foi um fim-de-semana dedicado aos trilhos e à amizade nos trilhos, participando no Columbus Trail, uma maratona de trilhos e uma ultra maratona pela ilha de Santa Maria, Açores.
A organização do Azores Trail Run, capitaneado por Mário Leal, estreou-se na ilha do Faial em 2014 e depois de conquistar também os trilhos do Triângulo (Faial, São Jorge e Pico), desta vez for a Ilha Mariense a ser explorada pelos trail runners. Foram cerca de 88 participantes que exploraram 42 ou 77km da ilha mais ocidental do arquipélago, a ilha de Santa Maria. A prova dos 42km era igual à dos 77km, sendo que esta última, continuava, completando uma volta completa à ilha, com partida e chegada no centro da Vila do Porto.
De forma a aproveitar bem a ida ao arquipélago, apanhei o voo de 6ª feira de manhã à Ponta Delgada, São Miguel, para, depois de uma escala de cinco horas, apanhar outro vôo a Santa Maria. A escala em São Miguel foi aproveitada ao máximo. Contratei um serviço de visita guiada de carro com pickup no aeroporto, para...
explorar a Lagoa das Sete Cidades, uma das Sete Maravilhas de Portugal. Este tour com o Pedro foi excelente para conhecer melhor a história e cultura de São Miguel. De Lisboa a Ponta Delgada são apenas duas horas de voo e daí a Santa Maria, apenas 20 minutinhos.
Chegados ao aeroporto de Santa Maria, sentiu-se logo a excelência da organização das provas do Azores Trail Run: um autocarro à espera dos atletas para nos levar gratuitamente ao Hotel Colombo, onde muitos estavam hospedados e onde se localizava a secretaria e também a pasta party. O check-in no hotel fluiu e depois seguimos para o levantamento do kit do atleta e pasta party. Mas que pasta party! Um buffet de massas (cerca de 5 variedades) e saladas e um buffet de sobremesas também. Uma delícia e um sonho para quem vai correr nos trilhos na manhã seguinte. Depois do briefing sobre a prova, pela própria Mário Leal, estava na hora de dormir. Antes de me deitar, ainda fiz a minha rotina de yoga para descomprimir. Dormi muito bem.
Às 6 e picos da manhã toca o despertador. Pelas 7 horas um autocarro levaria os atletas à zona da partida, que seria pelas 8 horas. Uma delícia de pequeno-almoço, onde foi difícil conter-me e não comer coisas “esquisitas”, e toca a apanhar o autocarro. A zona da partida, junto à marina da Vila do Porto é emblemático em si e cheia de trail runners, o ambiente tornou-se mágico. Havia música para animar os atletas e depois do controlo zero, a prova arrancou a horas, com o apoio da população local que já se havia levantado para nos apoiar. Espetáculo.
É verdade, um dos pontos altos desta prova são, sem dúvida os Marienses. As pessoas de Santa Maria, e penso que da maioria das ilhas dos Açores, são extremamente simpáticas e fazem tudo para fazer sentir os visitantes em casa. Nos abastecimentos, que havia de 10 em 10 kms, e eram bastante completos, os voluntários eram sempre extremamente simpáticos e prestáveis. Nas zonas mais habitadas, as pessoas saíam à rua para bater palmas e nos apoiar. Na rua, também fora da prova, as pessoas cumprimentam-se.
Há cumplicidade entre estranhos e isso foi muito bonito de se ver. Dou dois exemplos engraçados. O primeiro foi o facto de andarmos tranquilos de boleia pela ilha. No total, em 2 dias, apanhamos cinco boleias, algumas com gente desconhecida que com muito gosto davam uma voltinha para nos levar ao destino. E segundo, no check-in no aeroporto na viagem de regresso, a assistente da Sata reconheceu-me e disse: “muitos parabéns, menina, vi-a a subir a fajãzinha. Admiro muito a sua força de vontade”. Isto foi às 6 da manhã. She made my day! :D
Voltando à prova. As minhas últimas provas de trail têm sido a puxar pelas minha amigas. É algo que adoro fazer: no Javali pela Ana, nas Bruxas e Bucelas pela Natália e nos Abutres pela Sara. Mas esta prova iria ser diferente. Iria puxar por mim. Com o objetivo de evitar eventuais engarrafamentos, decidi puxar bem logo no início. Apetecia-me ser eu a marcar o ritmo e não ficar congestionada por uma fila indiana. Quando isso acontece normalmente não gosto de ultrapassar. Foi por isso que arranquei “a abrir”.
Todos os quilómetros dos 42km de prova foram fantásticos, mas esta primeira foi especial. Como tínhamos chegado já de noite no dia anterior, ainda não sabíamos o quão bonito seria Santa Maria. Foram quase 15km de single tracks ou de pastos sem trilho, onde eram as fitas que nos guiavam. O percurso, sempre junto à costa era mesmo deslumbrante. O verde dos campos, o preto das formações rochosas vulcânicas e os dois tons de azul, o escuro do mar e o claro do céu desenhavam um quadro perfeito, km a km. Estava um dia fantástico, perfeito para correr. Neste primeiro troço, passámos no cimo de falésias de centenas de metros de altitude, por relvados fofinhos no meio das vacas, por túneis de vegetação muito densa, por cascatas que beijam o mar e pelas praias de calhaus negros. Sentia-me tão feliz e forte que sabia que a prova iria correr bem. De vez em quando não resistia à beleza da paisagem e parava para tirar fotos ou filmar.
Foi por três vezes que, na prova dos 42km, descemos até ao nível do mar para depois subir até aos 250-300m de altitude em apenas um ou dois quilómetros. Estas subidas foram bem duras, principalmente na zona da Maia e de São Lourenço, onde foram escadas em pedra, tipo parede. De vez em quando virava as costas à parede para recuperar a energia com as vistas fantásticas. Foram nestas subidas íngremes que os bastões me salvaram. Tenho que fazer mais treinos de escadas!
A meta estava localizada na vila de Santa Bárbara, junto à igreja onde muito simpaticamente cada atleta foi aplaudido pela população local. Enquanto para uns a prova terminara aqui, para outros, ainda faltavam 35km de dureza e beleza. Quando cruzei a meta confesso que estava aliviada. Tinha adorado cada passo que dei, mas tinha vindo a puxar e estava cansada. Por outro lado, estava muito aliviada porque me sentia bem e sem mazelas. Vem aí a maratona de Barcelona e seria chato lesionar-me duas semanas antes. Quando as senhoras da meta me disseram que tinha sido a segunda mulher dos 42km a cruzar a meta nem quis acreditar. Pedi para confirmarem! Realmente, estava bastante satisfeita com o meu desempenho, 42km e 2000m de D+ em 6h30 foi muito melhor do que as minhas estimativas. Dez minutos depois chega a Patrícia Gomes, foi a terceira mulher! Que bom! A Margarida, uma atleta Açoriana tinha sido a primeira.
Foi então que ficamos a apoiar os atletas que iam chegando enquanto comíamos um delicioso caldo verde e folhados caseiros e bolo de banana que faziam parte desse abastecimento.
Assim que havia chegado um número suficiente de participantes à meta, um autocarro levou-nos ao hotel. Aí foi banho rápido e vestir-nos para irmos à zona da partida onde também seria a meta dos campeões dos 77km. Um ambiente fantástico: música ao vivo, um apresentador a anunciar a chegada dos atletas e um buffet de salgados e bolos bem como canja de peixe e cerveja no moto clube Mariense. Cada vez que um finisher entrava no moto clube, onde os atletas de ambas as provas conviviam, batiam-se palmas. Um ambiente fantástico onde deu para conhecer muitos outros participantes e partilhar experiências.
No domingo, antes do almoço final e entrega de prémios no hotel Colombo, fui dar uma corridinha para esticar as pernas. O almoço foi mais uma vez espetacular! Boa comida, bom vinho e boa companhia. Foi com muito orgulho que, com o Correr na Cidade ao peito, recebi o prémio de segundo lugar na geral feminina e primeira mulher no escalão sénior. Confesso que não estava nada à espera e acredito que foi o facto de não saber que iria em segundo lugar que me fez conseguir manter o bom desempenho. Talvez se soubesse, a pressão de manter o lugar seria muita e teria me deixado ir abaixo. Não sei… Também não interessa. Vim a Santa Maria para desfrutar dos trilhos e puxar por mim. Esse objetivo foi conseguido e superado. O pódio foi a cereja no topo do bolo. À tarde aproveitámos para fazer uma caminhada e apanhar as fitas de um troço do percurso.
Mais uma vez, adorei correr nos Açores, tanto pela paisagem natural incrível como pela excelente organização da prova em si. Ainda este ano gostaria de voltar a correr nas ilhas. Vejamos se será em Maio no Faial ou em Outubro nas ilhas do Triângulo.
Pontos positivos:
- serviço completo: transfers, refeições e convívio. O atleta só se tem de preocupar com a corrida.
- kit do atleta: para além da t-shirt, buff e medalha, ainda incluía biscoitos regionais e uns brindes alusivos à ilha de Santa Maria.
- convívio: a pasta party, receção nas duas metas e almoço no dia depois da prova proporcionam oportunidades de convívio e estreitamento de laços entre os participantes.
- simpatia da população local: cinco estrelas, como foi mencionado acima.
- beleza extrema: as imagens dizem tudo.
Pontos a melhorar:
- nada. Na prova dos 42km, diria que não há nada a melhorar. Eventualmente alguns pontos de sinalização, mas nada de grave.
- última parte do percurso dos 77km. Alguns atletas da prova dos 77km queixaram-se de que os últimos quilómetros do percurso, junto ao aeroporto, eram muito monótonos e aborrecidos e deixavam uma última impressão que não faria jus à beleza da ilha como um todo.