Diabetes e a corrida: quais os grandes desafios?
Por Ana Sofia Guerra:
No Estrela Grande Trail deste ano tive a oportunidade de conhecer o João Pedro Baptista que, para além do desafio que tinha de correr 26 Km, tinha de saber gerir um problema de saúde: a Diabetes. E, por isso, achei importante entrevistá-lo para que nos desse o seu testemunho
Há quanto tempo e como é que descobriste que tinhas diabetes?
- A Diabetes foi diagnosticada no início de 2009, após várias glicémias elevadas nas análises que fazia periodicamente, pelo facto de ser militar e sermos controlados frequentemente. Quanto a sintomas, tinha apenas um que sentia com mais frequência, que eram as cãibras, mas que não fazia ideia na altura estarem ligadas à diabetes.
Como é que se caracteriza a tua diabetes? Tipo 1 ou 2?
Tipo 2.
Recorres à insulina injectável?
Não. Inicialmente tomava 3 comprimidos que me foram sendo retirados, à medida que s glicémia ia sendo controlada. Actualmente, mantenho o valor da glicémia controlado, somente com a alimentação e o exercício fisico.
Tiveste o acompanhamento duma nutricionista no hospital ou centro de saúde?
Depois de me terem diagnosticado diabetes, foi-me marcada uma consulta no Endocrinologista no Hospital Militar de Lisboa e, na primeira consulta, o médico disse-me para eu marcar consulta com uma nutricionista, também no HMP (Hospital Militar Principal), pois precisava de perder peso e aprender a "comer".
Quais as grandes dificuldades que tiveste (ou tens) em gerir a alimentação no dia-a-dia?
De início tive algumas, pois tinha uma alimentação pouco saudável mas, actualmente, o organismo e o meu estilo de vida alterou-se tanto, que as alterações que fiz inicialmente já passaram a ser rotina. No entanto, de vez em quando também faço as minhas pequenas "loucuras", mas isso porque faço bastante desporto e já aprendi a ouvir o meu corpo.
Que tipo de alimentos deixaste de comer quando soubeste que tinhas esta doença?
Essencialmente, deixei os fritos, os sumos e carnes ou alimentos com muita gordura e comecei a comer à base de cozidos e grelhados, sempre acompanhado de legumes e saladas.
Há quanto tempo é que corres ou participas em provas de corrida e/ou trail?
Comecei há mais ou menos três anos. Inicialmente comecei com provas de estrada, tendo evoluído gradualmente. Um ano após ter começado a correr com regularidade e a fazer algumas provas mais curtas, fiz a minha primeira meia maratona. Depois disso já fiz mais quatro. Actualmente, estou mais direccionado para os trails, tendo já feito algumas provas com alguma dificuldade, mas de uma satisfação enorme.
Se num atleta sem diabetes, a alimentação numa prova de trail já é um desafio, quais os truques que fazes para gerir a tua alimentação numa prova de trail?
No meu caso, o mais complicado foi conhecer o meu organismo e saber como ele se comportava em cada uma das situações. Por exemplo, quando comecei a correr, comecei a fazer estrada e, neste caso, como não existem tantas variações de altimetria e de ritmos, é mais fácil controlar a hidratação e os “açúcares”. No trail running já funciona de maneira diferente, pois o desgaste é maior. Como desidrato bastante, levo sempre muita água (por isso levo sempre mochila) e como tenho muitas cãibras levo sempre magnésio líquido ou em pastilha. Levo também uns géis que vou gerindo conforme a necessidade. Há pouco tempo, também comecei a levar comigo sal, pois é bastante útil para quem como eu, desidrata com facilidade.
Já tiveste algum susto numa prova de trail por causa da diabetes?
Sim, foi num trail em Alvados, onde senti pela primeira vez na minha vida o que é estar completamente desidratado. Nessa altura só levava água e paguei cara a factura, pois apesar de ter chegado ao fim, cheguei completamente desgastado. Durante a prova tive tantas cãibras, que acabei por descobrir que tinha músculos que nem imaginava que ter (riso). A partir desse trail, tentei nunca mais ser apanhado desprevenido e prefiro sempre levar coisas a mais, do que sentir, como me senti em Alvados.
Qual a sensação de correres com uma nutricionista? (riso)
Excelente (riso), pois foi uma maneira de aprender mais um pouco sobre o nutrição e o que fazer perante algumas das quebras que sentimos numa prova. Além disso, aproveitei para ter uma consulta de borla (riso).
Quais os conselhos que darias às pessoas que têm diabetes e que gostavam de correr, mas que têm receio de o fazer?
Comecem devagar, mas comecem, pois ao início custa imenso e os resultados demora, mas, passado um tempo, começam a ver resultados e o nosso corpo começa a "pedir" mais exercício. No meu caso, que era bastante sedentário, comecei mesmo muito devagar. Lembro-me que ao início fazia 12 minutos a correr e ficava completamente de rastos. Mas não desisti e fui melhorando, depois dos 12min, passei para os 15, depois 20 e por aí adiante. Quanto tempo demorou até chegar às corridas? Quase 2 anos até fazer a minha primeira corrida de 7 kms (custou-me tanto). Depois... depois fui fazendo mais e mais. Já tive lesões (coisa que nunca tinha tido) pois não fazia nada (riso), mas nunca desisti. Tracem objectivos, comprometam-se com outras pessoas, mas nunca deixem de se mexer porque, para quem tem diabetes, o exercício físico é fundamental, seja a correr, a caminhar, andar de bicicleta, nadar, etc.
Quais os teus próximos desafios no mundo da corrida?
Os meus desafios são ir fazendo provas que nunca fiz, repetir as que mais gostei e aumentar as distâncias, sempre que possível.
Para terminar, gostaria de agradecer esta oportunidade à Ana, pois é sempre muito positivo, quando com a nossa experiência, podemos ajudar outras pessoas com este enorme problema que é a DIABETES.
Em relação ao exercício físico e aos trails, existe outra vertente bastante aliciante, que é o espirito de entreajuda que lá encontramos e ,claro, conhecer pessoas como a Ana. Aproveito também esta entrevista, para agradecer ao grupo de Amigos dos Galgos de Tancos ao qual pertenço, que aproveitam esta actividade, para promoverem a amizade e o convívio a cada prova que fazemos. Como nós, existem muitos outros grupos que fazem o mesmo e o engraçado nisto tudo é que nunca nos vemos como adversários, mas sim como outros grupos de amigos que competem (saudavelmente) entre si.
Obrigado Ana!
João Baptista