Crónica VIII - o tempo passa a correr
Por Filipe Gil
Quarta-feira, dia 25 de fevereiro
Treino INTO THE WILD guiado por David Faustino.Um treino muito, muito bom. Subimos, subimos e continuámos a subir. Deu para testar o meu novo frontal da melhor maneira (é um Led Senser HR7 v2), isto porque às tantas a meio do treino perdi-me e fiquei sozinho, no escuro dos single tracks de Monsanto durante uns 10 minutos. Culpa minha. Fiquei entre o dois grupos do treino, sozinho e o David disse-me, é sempre à esquerda. E eu, chego a um cruzamento e viro para a direita, convencidissimo que estava a virar para a esquerda - podem rir, é defeito de fabrico. Sabe Deus como consegui tirar a carta de condução...
O fato de me ter perdido - sem ter qualquer noção de onde era o norte e sul - foi pacífico. Pelo menos até certo ponto. Várias coisas me passaram pela cabeça, confesso. Mas tentei controlar o relativo medo que senti na altura com um jogo interessante com a cabeça. Tentava pensar que estava no Mont Blanc a meio da noite e que tudo iria correr bem. Ou que estava num prova nos Estados Unidos e que logo, logo iria encontrar alguém (amigável, claro). Estava a safar-me.
Até que ouvi ladrar de cão grande (sabem a diferença, certo?) e aí tudo o que era uma tentativa de encontrar pontos de referência em Monsanto foi por água abaixo. Corri na direção contrária a toda a velocidade e fui ter a uma estrada. E aí percebi onde estava, finalmente. Consegui encontrar o grupo num instante, e ninguém percebeu que me tinha perdido. Ninguém se preocupa com os "organizadores" do treino e como os restantes membros da crew estavam - como estamos sempre - preocupados com os nossos convidados, ninguém deu pela minha falta. E ainda bem.
Mesmo com isso foi um treino positivo para mim. Senti-me bem. Apesar de não estarmos com um ritmo elevado, senti-me com força para acompanhar o grupo da frente, senti que os treinos começam a dar frutos, finalmente!!! Este treino demorou um pouco mais do que esperado porque dividimo-nos em dois grupos e um deles pensou que tínhamos seguido por um caminho e nós fomos por outro.
Ficou a lição aprendida que isto de guiar cerca de 30 convidados por Monsanto, à noite, e em trilhos difíceis não é fácil. Mas é um grande orgulho pertencer a esta crew. Estamos cada vez melhor a guiar pessoas nos trilhos.
Domingo, dia 1 de março
Dia de treino com alguns elementos da crew e o amigo Rui Alves Pinto. Às 8h da manhã já lá andávamos por Monsanto. Fomos fazer o reconhecimento do treino THE PACK, tendo em conta um circuito desenhado pelo ultra Pedro Conceição. Aliás relembro aqui que ainda temos algumas inscrições até ao dia 6 de março para os homens de verdade que queiram correr ao nosso lado pelo trilhos noturnos de Monsanto. Atrevam-se!
Foi um treino "puxadinho". Não estava para lá virado, mas ao fim de 10km aqueci e já me estava a sentir bem, sobretudo nas subidas. Percebi também que o novo piso que a CML colocou na rampa da A5 e do Cozido é terrífico para os meus joelhos, sobretudo quando desço. Num trecho pequeno, descemos para voltar a subir e o meu joelho direito queixou-se logo.
Começa a crescer em mim uma grande dúvida em relação ao calçado. Se levo os Puma Faas 500 TR versão 1 ou versão 2. Os primeiros já estão muito feitos ao meu pé. Os segundos ainda só fizeram 20 e poucos quilómetros, mas são mais giros...Tenho que decidir em breve, o resto da indumentária está escolhida e testada. No próximo sábado irei ter um treino longo onde já pedi aos meus colegas de crew mais experientes para apertarem comigo. Serão cerca de 4 horas a correr. Para preparar bem o Piódão.
Ainda em Monsanto, cruzamo-nos com a partida da Corrida da Árvore - já a fiz duas vezes - e incentivámos com umas palmas os corredores.
Depois deste treino alguns elementos foram a um dos nossos treinos sociais, eu infelizmente não pude ir. Foi um treino muito interessante feito em parceria com o Açores Trail Run.Um treino com muita gente e com um sorteio que ofereceu viagem, estadia e dorsal para a prova açoriana.
Por último, e por hoje, queria partilhar convosco algo que está intrinsecamente ligado à minha preparação para o Ultra do Piódão: a minha barba. Sim, leram bem: b a r b a . Desde que comecei a minha preparação para esta aventura que não corto a barba - sim, aparo-a, porque senão ainda recebia moedas no Metro ou a minha mulher e filhos cortavam-me os pêlos durante o sono.
Mas a razão é mais uma forma de, no dia-a-dia, me lembrar da minha aventura. De me ajudar também que a resiliência e vontade e espírito de sacrifício que estou a colocar nesta contenda podem ser transpostos para o dia-a-dia. Que a corrida, por vezes, não é mais do que um sinónimo da nossa vida, com altos e baixos, com alturas que parece que vamos atirar a toalha ao chão, mas com outros gloriosos que nos permitem rir e sorrir.
A minha dúvida é cada vez maior. Será que vou sorrir no final do Ultra do Piódão?
p.s. - completamente farto do inverno. Farto de correr com impermeável, tshirt interior, tshirt de fora, sem saber como sair de casa antes de ir 3 horas para correr em trail. Quero correr os trilhos com pouca roupa e calções curtos!!!