Azores Trail Run 2016 - A continuação...
(Vulcão dos Capelinhos)
Se não leram a primeira parte talvez devam começar por aqui...
Como tinha referido, tudo ia bem até à chegada à Caldeira, o problema foi que uma uma vez entrado no trilho que a contorna, o S. Pedro decidiu transformar a Caldeira num caldeirão, onde quis fazer uma sopa cujos ingredientes principais eram: água, lama, bosta de vaquinha (é normal... estamos nos Açores e as vacas povoam a ilha) e atletas de Trail. Para juntar a festa e porque queria uma sopa bem cremosa, decidiu por a Bimby na velocidade de 10.
Conclusão... o vento de frente e as fortes rajadas, dificultavam imenso a progressão, bem como tornavam a prova muito mais perigosa.
Mais devagar, mais ainda assim a um ritmo agradável lá ia progredindo quase ao sabor da meteorologia. O fundo da Caldeira de vez em quando dava um ar da sua graça permitindo vislumbrar, ou melhor imaginar o que seria aquele local num dia de sol.
Para juntar à festa, o traçado da prova não segue inteiramente o trilho já bem calcado, mais ou menos a meio faz uma cortada à esquerda e estamos literalmente off-road e enfiados naquilo que suponho sejam ser pastos para vaquinhas. Na prática +/- 4km em que a melhor forma de descrever a progressão no terreno é esta:
Passamos a ser o Super Mário a saltar de tufo em tufo, num caminho quase interminável e com chuva e ventos fortes a massacrar-nos a cara.
Tempo ainda para o único engano do dia, não por culpa da organização (embora o local merecesse-se mais umas fitinhas), mas porque simplesmente, naquele momento, a minha atenção tinha de estar tão focada onde metia os pés que as fitas foram simplesmente ignoradas (o engano "custou-me" 11 lugares).
Chegado ao quarto abastecimento, compreendi que tinha andado 1h50m para fazer 11km quase sem D+. A parte boa era que continuava a sentir-me muito bem e tinha saído daquele jogo de saltos sem nenhuma mazela.
Alimentei-me, enchi os flasks e tive de pela primeira vez esvaziar as sapatilhas do lastro que se tinha acumulado dentro delas... digamos que havia brita com fartura.
A parte seguinte o percurso começa num trilho completamente alagado, com lama que por vezes nos enterrava até o joelho, e desemboca num belo estradão descendente no qual pude finalmente descontrair e relaxar as pernas.
Pensei eu... "Agora vou começar a meter ritmo outra vez..." Errado Pedro! porque antes de chegarmos à casa das Lavadeiras (5º abastecimento) havia que correr na levada (lindíssima com uma vegetação fantástica), completamente alagada com a água a galgar o caminho e descer rampas de lama balizadas por arame farpado.
(Foto: ClickFaial - Chegada à Casa das Lavadeiras)
Como podem ver pela minha perna direita, esta descida não correu tão bem como a outra, numa curva fiz um belo drift. Resultado final? deixei um bocado de carne nos Açores. Siga para Bingo...
Depois da Casa das Lavadeiras o percurso tornou-se todo ele corrivel, e como estávamos a baixar de altitude o S. Pedro começava a a dar tréguas. O próprio terreno começava também a mudar a textura da lama passou de uma pasta viscosa, para uma consistência mais grossa. Estas duas mudanças permitiram que me esticasse nas descidas, conseguindo assim imprimir mais algum andamento.
De salientar, o fantástico single track , em que o cheiro da terra molhada juntamente com um cheiro peculiar da vegetação desta zona proporcionaram mais um momento de êxtase.
(Foto: ClickFaial)
Do final do single track até à meta, foi cerca de 1km realizado naquela paisagem lunar e única que é vulcão dos capelinhos. Só quem lá esteve compreende a magnificência daquele local.
No final realizei o Faial Costa a Costa em 06:28:45, o que deu um 37º lugar na geral e 19º no escalão. Um bocado acima do que contava fazer mas tendo em conta o terreno abutrico e a tempestade que se abateu sobre a ilha posso dizer que fiquei bastante satisfeito.
De forma geral, efectivamente não tenho nada a apontar à organização, que devido às condições meteorológicas imprevisíveis foi posta à prova como nunca pensou vir a ser. Saliento ainda o seguinte:
- O percurso é equilibrado e todo ele corrivel (para quem tem pernas) se a meteorologia for favorável;
- As marcações estavam bem feitas com um espaçamento correto, minimizando assim a possibilidade de falhar a navegação (o erro que realizei foi 85% tolice minha);
- Os abastecimentos estavam nos locais corretos, sempre fartos e versáteis o suficiente para que não tivesse sequer comido uma das minhas barras;
- Os voluntários foram sempre prestáveis, simpáticos e afáveis;
- Como estamos numa ilha e a prova tem um número relativamente pequeno de atletas, cria-se um ambiente muito familiar. Foi muito bom ver isto nos dois jantares oferecidos pela organização.
Por fim, quero apenas referir que a prova foi apenas a cereja no topo de um bolo muito delicioso que são os Açores. Nesta estadia de 5 dias pude visitar o Faial numa scooter, conhecer os seus recantos e lanchar numa festa de aldeia umas belas favas com pão de milho... Pude visitar a ilha do Pico, conhecer as suas vinhas, ver as suas lagoas, subir à casa da montanha e por fim visitar a gruta da torre (maior túnel lávico da Europa)... Pude passear de barco, ver golfinhos, baleias e cachalotes...
Por tudo isto digo... até breve Faial...